Começa hoje, em Nova Iorque, uma longa semana de conferências e eventos sobre os maiores desafios da Humanidade. Por dezenas de espaços espalhados pela cidade – das Nações Unidas a cafés de esquina – passarão chefes de Estado e de governo, CEOs de empresas sonantes, organizações da sociedade civil, cientistas e académicos, e até artistas e atletas. Terá lugar a Assembleia-geral das Nações Unidas, a Clinton Global Initiative, a World Biodiversity Summit, a UN Global Compact Leaders Summit, e dezenas de eventos independentes que, no seu conjunto, compõem a Climate Week New York. Paz, pobreza, saúde, educação, clima, biodiversidade, poluição, igualdade de género, emprego e economia global serão temas em debate. Ora, dado que tenho o privilégio de cá estar, partilharei um breve diário de bordo ao longo da semana.
Um dos balanços que será apresentado é o do grau de concretização dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (2015-2030) das Nações Unidas, agora que chegámos a meio do caminho. Infelizmente, mesmo que aceleremos, muitos serão já inalcançáveis até 2030. Coloca-se, assim, a questão de saber a que se deverá esse fracasso, dado que os recursos – materiais e imateriais – de que dispomos são suficientes para os alcançarmos.
Feita uma leitura diagonal das agendas dos eventos, surpreende a quase ausência da dimensão pessoal. Não dependerá também a paz, sociedades coesas e um planeta saudável do modo como cada um de nós floresce enquanto pessoa? Havendo conhecimento, tecnologia e riqueza suficientes, bem como vontade política – expressa em acordos assinados por todos os países –, por que motivo persistem tantos desequilíbrios? Não faltará acrescentar a importância de uma dimensão de ordem mais poética ou espiritual?
Pouco tempo depois de as Nações Unidas proporem uma cartografia para o desenvolvimento sustentável – os tais 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável –, surgiu uma proposta complementar de cinco Objetivos de Desenvolvimento Pessoal (ou Inner Development Goal) –, estes mais focados no que é interior ao indivíduo, não no que é coletivo ou lhe é exterior.
Não terão as ideologias que herdámos da modernidade e as democracias liberais privilegiado demasiado o que é objetivo e material, face ao que é mais subjetivo e pessoal? É evidente que os desígnios coletivos servem o bem-estar das pessoas, mas para se construir esse edifício não teremos de nos preocupar com a sua base de sustentação? Se políticos, gestores e cientistas – ou antes, todos nós, nos nossos múltiplos papéis, inclusive como consumidores – não fizermos um caminho de maior conexão interior, como seremos capazes de estabelecer uma relação justa com o que é nos exterior e alcançar utopias coletivas?
A dimensão pessoal é complexa e tem poucas cartografias universais, mas não é por isso que não deve ser um caminho a debater e percorrer. Dessa nossa disponibilidade para diariamente nos olharmos ao espelho – e darmos um passo em frente – também depende a mudança de paradigma de desenvolvimento, para algo muito menos materialista, extrativo e egoísta.
Contra o excesso de racionalismo tecnocrático, ousemos assim explorar outras dimensões. Foi o que fez a Fundação David Lynch, ao introduzir a prática diária de uma breve meditação antes do início das aulas, em escolas do primeiro ciclo de bairros violentos, obtendo excelentes resultados, tais como a diminuição da ansiedade, da agressividade e do abandono escolar, e a melhoria do desempenho escolar.
Até amanhã.
in Visão Verde